A Lambretta
O meu pai tinha uma Lambretta.
Não dessas máquinas modernas e insossas de agora, mas Lambretta, pura e dura, com 2 selins à maneira. Tudo muito anos 60, “comme il-faut”.
Por isso, eu andei de Lambretta.
Lembro-me vividamente da sensação de “andar de Lambretta” na idade da inocência. De pé, na plataforma, esguio e franzino, fui descobrindo o meu minúsculo mundo de então, com o vento na cara e os cabelos em permanente desalinho.
Um dia a Lambretta parou e ficou para sempre imóvel, durante anos no mesmo sítio, a apodrecer por falta de resguardo do rigor dos elementos.
Mesmo parada, não cessei de a cavalgar, por montes e vales, com miúdas na garupa, fazendo vruuummm, deitado nas curvas em equilibrismos temerários e arrepiantes, sempre sem capacete, para melhor aproveitar os benefícios do vento nos cabelos. Sem sair do pátio.
Até que um dia, alguém a levou por uns trocados, para desatravancar.
Tenho pena de não ter crescido suficientemente rápido para poder tomá-la do meu pai. E depois, de certeza, ser eu a deixá-la apodrecer, no sítio onde sempre esteve.
Calhando, um dia terei que comprar uma Lambretta, daquelas à maneira, com 2 selins, para deixá-la encostada a enferrujar num sítio de onde nunca deveria ter saído.